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21 outubro 2020

Resumo Transformação da Sociedade pela Educação: Contradições que permanecem


  
    

        Na nova Lei de Diretrizes e Bases da educação, que foi aprovada no Governo Cardoso, a educação básica tem por finalidade primeira “desenvolver o educando, assegurando-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania, e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores” (Lei nº 9.394/96, art. 22) bem como, se organizar nos níveis fundamentais e médio (art. 24). Além do mais, tem também como finalidade, expressa no art. 22 da Lei, fornecer ao educando “meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores”. 

        Neste pressuposto, a LDB apresenta-se como uma instância complementar à cidadania no sentido de realizar, pela educação, algumas das condições básicas para o exercício consciente da cidadania política. Assim, a educação básica da escola brasileira depara-se com problemas que incorporam e ultrapassam o âmbito nacional e o escolar porque dizem respeito à história e à cultura do país e à reprodução econômica em todo o planeta, apesar de suas particularidades locais.

        Nas tendências neoliberais, a concepção mercantil do conhecimento, tem como modelo a educação como um bem de consumo, que adquire seu valor na permuta entre a oferta e a demanda (GÓMEZ, 2001; SANTOMÉ, 2003). Desse modo, embora o direito à educação conste como condição para o exercício da cidadania, aqueles que podem pagar uma boa escola, recebem uma melhor educação, adquirem uma melhor qualificação para o trabalho e conseguem alcançar os melhores cargos, empregos e status. 

        O sistema neoliberal da educação promove uma mente consumista em seus usuários, passando a ter relação direta com os benefícios econômicos que possa produzir, vislumbrada como moeda de troca, onde o professor é o principal vendedor e o aluno o principal consumidor. O capital, em seus mecanismos, tende a manter tanto a subordinação do trabalhador quanto a qualidade de sua formação. O próprio desenvolvimento científico-tecnológico minimiza a necessidade de mão de obra humana em grande quantidade.

         A autonomia, permite que a escola, busque soluções mais adequadas às necessidades e as inspirações de seus alunos e de suas famílias. A ideologia do mercado entende que o sistema educacional pode desempenhar um importante papel na reestruturação do capitalismo, usando-o para o ajustamento social. Conquanto, a educação sempre foi reprodutora de novos paradigmas na formação do homem. A luta é justamente para que a qualificação humana não esteja subordinada às leis consumistas, à sua adaptabilidade e funcionalidade. 

        Kenski (2003. p. 35) descreve o professor como aquele que " oferece oportunidades para o desenvolvimento de processos de construção coletiva do saber, através da aprendizagem cooperativa...". Porém, o livre mercado mundial, influenciam diretamente na postura e no pensamento docente. A pedagogia do aprender a aprender tem o objetivo de aplicar a capacidade de aprendizagem a todos os domínios da vida social e profissional. 

        Segundo Duarte (2001), a pedagogia do aprender a aprender e o escolanovismo valorizam tudo aquilo que o indivíduo aprende sozinho a partir do conhecimento de outras pessoas. O indivíduo aprende pesquisando trabalhos realizados por diferentes estudiosos, assim, construindo o conhecimento por si só sem a ajuda do educador. Neste sentido, a verdadeira prática educativa deve ser impulsionada pelos interesses e necessidades do aprendiz. 

        Nesta relação pedagógica, segundo Guarrido (2001, p. 78), o professor assume o papel de mediador, coordenando e problematizando os momentos de diálogos em que os alunos tentam justificar suas ideias. Sendo assim, o professor deixa de ser um transmissor de conhecimentos para se posicionar como um mediatário de diversas linguagens e oportunidades educativas.

        O ponto de partida do modelo neoliberal foi a crise econômica e política dos anos 70-80 (campo político mundial após a Guerra Fria), que manteve um plano geopolítico internacional das correlações de poder e força entre Estados nacionais. Diante deste contexto, os organismos econômicos internacionais, tais como FMI, OMC e Banco mundial passam a impor diretrizes no Brasil, caso queira fazer parte da "globalização". As políticas de otimização, as novas regras de mercado do pensamento neoliberal, a redução dos gastos públicos, a liberalização e desregulamentação da economia, são exigências para a integração na "Nova Ordem Mundial". 

        No campo educacional, a adoção da nova ordem se fundamenta na ideia de modernização, que caracteriza o encadeamento de transformações, cujo apoio e determinação do poder econômico, reconfigura as relações de trabalho, definindo e recomendando outro perfil de docente para atuar na escola pública. As reformas educacionais, são por tanto, consequências de políticas de reforma do Estado e não têm interesses em alterar as correlações de forças sociais instituídas (NAGEL, 2001). 

        O governo central passa a definir os conteúdos mínimos da educação obrigatória, avaliar os resultados obtidos pelas unidades descentralizadas e estabelecer as normas gerais para o sistema educacional. Em 1996, um documento denominado "A Nação Convocada" assume o Compromisso Nacional pela Educação Básica, que tem como meta, viabilizar a inserção competitiva do país nos novos processos econômicos internacionais. Este documento equipara os cidadãos a "consumidores", revelando um caracter mercadológico que impregna a concepção de cidadania dos dias atuais. 

        É nessa cultura declarada "pós-moderna" que a maioria dos educadores se sentem inseridos, assim, toda e qualquer proposta educacional que não se alinhem a esse modelo, é considerada ultrapassada, conservadora e desqualificada. No Brasil, neste período, várias estratégias “modernizantes” no campo político, econômico, educacional e administrativo foram utilizadas com o objetivo de “enfrentar” a crise e “reconfigurar” o Estado. O posicionamento de diversos educadores em seus pronunciamentos nos encontros e congressos de educação dos anos 90, fazem reflexões acerca de onde o professor se situa e qual é o seu papel no seio da sociedade contemporânea que abordamos. 

        Segundo Saviani (1992, p.19), a cristalização desse modelo dominante nos anos 90, é “...uma atividade não material cujo produto não se separa do produtor a educação resulta, como regra, incompatível com a exigência de lucratividade inerente a todo investimento especificamente capitalista”, foram traduzidas na forma do imperativo de planificação dos sistemas de ensino e dos processos pedagógicos. A educação passou a ser concebida como sendo dotada de um valor econômico próprio; isto é, um bem de produção (capital) e não apenas bem de consumo. 

        Do mesmo modo, Cury (1992, p 84), no seu trabalho apresentado no simpósio: O Público e o Privado na Educação Brasileira, faz a mesma constatação. Ele afirma: “O que é inteiramente gratuito não será jamais tão bom quanto aquilo que contém a “exigência da moeda”. Nesta perspectiva tornar-se-á comum no universo educacional a acusação de ineficiência da escola pública, em contraposição à qualidade das escolas particulares. Neste sentido, A relação entre escola pública (má qualidade) e escola privada (boa qualidade), como instituições antagônicas, instala a competição na educação. Desta forma, se a competição é saudável, o melhor competidor é aquele que pode oferecer o melhor padrão de qualidade. Importa o resultado e não as metas para todo o sistema educacional. 

        Catani (1996, p.561), analisando o texto “A Nação Convocada”, de 1996, documento emanado pela Presidência da República, afirma: “Não por acaso, o documento equipara cidadão a consumidor, revelando o caráter mercadológico que impregna a concepção de cidadania dos setores hegemônicos”. Isso, aprofundam a tese de que só na medida em que somos consumidores, não apenas no âmbito da economia, é que teremos oportunidades reais na sociedade globalizada, incluindo-se nisso os procedimentos institucionais escolares. 

        Velloso (1992, p.107) no texto, para um simpósio sobre políticas públicas afirma que: “a crença na importância do mérito individual conduz a limitadas intervenções do Estado, destinadas a corrigir apenas parcialmente as distorções (...) e o cerne dessas políticas é a crença no êxito das forças de mercado para alocar oportunidades”. Em suma, cada consumidor poderia aplicar seu orçamento doméstico onde melhor lhe aprouvesse, ou seja, exercer livremente suas escolhas. 

        Mello (1992, p.209) aponta que a autonomia da escola não é um fim em si mesma, mas deve visar a melhoria da qualidade do ensino com equidade. Até 2030, acordou-se “assegurar a educação inclusiva e equitativa de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos” (Agenda 2030, ODS 4). Equidade consiste na adaptação da regra existente à situação concreta, observando-se os critérios de justiça. Pode-se dizer, então, que a equidade adapta a regra a um caso específico, a fim de deixá-la mais justa. Ela é uma forma de se aplicar o Direito, mas sendo o mais próximo possível do justo para as duas partes. 

        Nogueira, Figueiredo e Deitos (2001, p. 126), afirmam que um dos pilares dessa reforma do Estado, é “a produção de bens e serviços para o mercado, e pelo fato deste constituir área de ação das empresas, é caracterizado pelas atividades econômicas voltadas para o lucro(...)”. Desse modo, a preocupação com o atraso educacional está centrada no controle da população, no retorno da produtividade e dos lucros para a economia. 

        Para Aguiar (1996, p. 510), a posição produtivista induz a reformas que se coadunam com a concepção liberal da sociedade, cuja expressão maior é o paradigma da qualidade total. E assim, na ideologia do educar para ser o melhor em qualquer competição, está alicerçada a educação dos anos 90. Em pleno século XXI, o sistema educacional ainda não determinou, propostas novas de ensino que abordem a tendência do individualismo planejado para a escola e pela escola pública ou privada. 

        Melhorar a qualidade e a equidade da educação básica é o principal desafio a ser enfrentado a curto e médio prazos. Qualquer discussão acerca de escolas de excelência no atual contexto da educação brasileira nos obriga a refletir sobre o que queremos para o futuro. Não adianta investir em ilhas de excelência quando a maioria das crianças e dos jovens sai da escola sem desenvolver os conhecimentos e as competências gerais para exercer plenamente seus direitos como cidadãos preparados para enfrentar os desafios do nosso século.

        Dessa forma, promover educação de qualidade para todos passa obrigatoriamente pela formação e melhoria da carreira dos professores. Nesse processo, a formação de professores, a qualificação de gestores comprometidos com mudanças efetivas, o aperfeiçoamento dos currículos das licenciaturas, com ênfase nas práticas que dão concretude aos fundamentos pedagógicos, e a melhoria das carreiras docentes são aspectos centrais de qualquer proposta de qualidade e excelência na educação. (Revista Pátio Ensino Fundamental nº 88, nov. /18- jan. /19.). A verdadeira reforma educacional está longe de ser uma realidade e como me ensinou um grande mestre, existem duas educações, uma para os pobres e outra para as elites.



Por: Socorro Oliveira 
Graduanda de Pedagogia 
Faculdade de Educação 
Universidade Federal do Ceará

Referencias:
SOUZA, S. A. . O Brasil Imperial e a Formação Educacional para as Elites. Relatus , Maringá - PR, v. 34, p. 06-08, 2005.

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